segunda-feira, 17 de maio de 2010

apenas as pedras


imagem: Robert in Toronto

as pedras choram
lágrimas de séculos
e se recolhem
às suas entranhas.
seus veios minerais
recolhem impressões
e calcificam saudades:

..estive aqui
joão ama maria
turma de 1950
voltamos um dia...


as pedras cantam
canções finitas
minadas pelo tempo
mimadas na memória
o tempo ecoa
nos salões gelados
estalactites brancas
e pontiagudas
apontando ao céu
E ao chão:
a memória canta
cantos de solidão:

...naquele tempo a gente era feliz
e nem havia tempo:era um suceder
de horas quentes, ritmo
alucinado
e sonhos engendrados
no varal das noites
de toda estação.

...estivemos aqui.
nestas muralhas
de rochas gravamos
a canivete
nosso momento feliz.
mil novecentos e cinqüenta e cinco.
mil novecentos e sesenta e oito
mil novecentos e sessenta e tantos.


mil.mil.mil.
dois mil e não se lê o resto
ou os rostos
dilapidados,atordoados
encalacrados na pedra:
sentimentos rupestres
que a água não leva
e a pedra consente
e conserva em âmbar:
prehistórias.

as pedras falam: sim,
a linguagem singular
do diamante e carbono
do opaco sentido do humano
e suas contradições:
brilho e obscuridade
têmpera fria do aço
e têmpora anêmica
que grava,crava
na pedra, suas sensações.

a poesia se instaura,
sorrateira
nesses ideogramas:
painel alucinado
do rude sentido
faiscando na pedra:
cacos, nacos de sonhos,
De tempos resgatados,
dos lembrares
bricabraques coloridos
de tantos tempos:

ah! painéis de areia e vento
cadernos de viagem
poemas rabiscados
a giz, grafite , a sangue,
em pedra, papel, ou pele:
somos todos assim.
imersos em nós e os outros
são os outros.

amamos..?
navegamos à deriva
em mares interiores
em sargaços infindáveis
e nos sonhamos eternos.

mas não somos.
apenas
as pedras são.
em seus retiros minerais
imemoriais.

2 comentários:

Adriana Godoy disse...

As pedras choram, cantam e guardam as memórias mais remotas ou mais recentes. Temos que aprender a lê-las! Lindo, denso e visceral poema, Danilo. Amei! beijo.

Márcia de Albuquerque Alves disse...

Danilo, ao ler essa linda poesia, fiquei pensando em quanto de memória, história, amores, música, sentimentos, lembranças, chegadas, despedidas e tantos outros sentimentos nas pedras ficam registradas, enquando despercebidos passamos. Bem, agora vou me ater mais, ver mais, ler, ler muito mais.

Lindo,
bjs