domingo, 29 de novembro de 2009

cru


imagem: the beggar- flickr/clownbastard

meu verso é cru,
é avesso
meu poema é escroto
é abjeto meu objeto
lírico:
dorme nos bueiros, nas cânulas
transita pelos becos
fede,
fode,
escondido nos cantos
dos viadutos.
mas fala de vida- disfarçada em morte
ou de morte em vida-tanto faz:
meu poema é incapaz
de se sentar em cadeiras estáticas:
é fugaz
e se esconde do neon.
...ao redor da mesa
dormem as cadeiras.
estáticas e sem êxtases
as palavras furtivas
não se furtam ao tato. mas
não há quem as recolha
E perecem.como frutas
podres, em odores
fétidos.
Não há quem as colha
em sua plenitude:
dormem os homens
ao redor das cadeiras.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

anarquipoesia

imagem: Poesia.jpg by bidari/flickr


ave, pablo!

Hoje amanheci poeta e estou entardecendo perdido na prosa. Prosear sobre poesia, sua natureza e exigências, sua dependência do poeta assim como o poeta depende dela, assim como o poeta depende do ar para respirar e da palavra para se expressar em meio às multidões apressadas, ensimesmadas e sem palavras para com aquilo que a rodeia.A Poesia é uma musa exigente e premente e nuca se sabe quando chega ou quando vai. Coloca-nos em eterna vigília, a buscar a senda das maravilhas e das palavras inauditas, encantadas, novíssimas em sua formulação e em seu entendimento, como diamantes recém- convertidos de um carbono abrupto. A poesia é assim, ataca-nos de repente, ata-nos as mãos do fazer diário e se instala, sorrateira e brejeira, em nossa mente e coração, que fica lírico a buscar revelações e encantamentos. E nos atracamos com ela, enrolados em seu leito de lírios e rosas, de cheiros e luzes, plenos de imagens que querem se traduzir aos olhos outros pela construção e encontro da palavra perfeita, da palavra que traga a luz, ao mesmo tempo tragando a luz que brilha em nossa mente.A poesia é isso: uma busca pela tradução, mais que perfeita, dos sentimentos imperfeitos, das nossas contradições, das antíteses que somos e nunca queremos deixar transparecer. A poesia, para isso, depende do poeta e o poeta depende da poesia,e muito mais, da plena liberdade, aquela gritada a plenos pulmões, daquele ar que escapa do escafandro deixando o mergulhador à mercê da água que lhe rouba os sentidos...A poesia necessita liberdade, incondicional e irrestrita, para que seja gestada e resgatada do limbo a que muitas vezes a condenamos. Por isso, rima não com burocracia, mas com anarquia e com apostasia. A poesia é avessa aos controles, às planilhas, às escotilhas, às camarilhas, às escolas, às escolhas, é avessa aos sistemas e regimes; o que a poesia busca é a pura tradução da beleza, este ser abstrato que se oculta nos mais inusitados lugares... Por isso, o poeta não deve e nem pode, enquanto poeta, preocupar-se com números frios, mapas de controle, perfis produtivos, gráficos e estatísticas. Vamos sim, nos preocupar com o pranto não chorado, a palavra não dita, os matizes ao invés de matrizes algébricas, com o homem e a mulher, enquanto seres iluminados e antenados com o universo no qual vivem.Por isso, enquanto poeta, não busco o raciocínio dos números e a frieza das estatísticas. E registre-se que, paralelamente, trabalho com números, que no contexto adequado, também possuem sua beleza... aliás, esta já é outra praia pois, para os matemáticos, os números são plenos de luz, beleza, incertezas e inesperado e isso, diga-se de passagem, também é pura poesia.No entanto, quero aqui celebrar a liberdade e o dever do poeta de trabalhar sempre a palavra, como o fruto de uma lavoura não árida, de uma lavoura fértil, de onde brotem os sentimentos e as sensações apreendidas enquanto homens, dominados e dominadores, senhores e irmãos da natureza. E para isso, sejamos anárquicos e deixemos que as palavras nos transportem aos mundos exteriores e interiores, e façamos dela nossa arma e nossa alma, faça-se a luz ordenou Deus, faça-se a sua tradução por meio da poesia, conclamou o poeta. E sejamos assim, teses( como nos poemas-conceito, matrizes para outros e outros e outros poemas), antíteses ( como nos poemas barrocos, contrastes perfeitos para a natureza humana, sua luz e escuridão), sínteses( como nos poemas concretos e haicais, equações líricas e pequenas flores de cor e forma intensas). Sejamos menestréis medievais, cantando barcarolas, sejamos clássicos, em sonetos formais, sejamos parnasianos, buscando a jóia perfeita da rima e do conceito, sejamos simbolistas, dando voz aos nossos elementos interiores, sejamos naturalistas, dadaístas sem um sentido aparente, sejamos surrealistas transmutando as palavras em imagens sinestésicas e sensuais, sensações pictóricas, sejamos sintéticos e prolixos, sejamos modernos, reeditando 22, sejamos enfim, eternos, e assim estaremos sendo contemporâneos, expressando os medos, vozes e vórtices do nosso tempo, esse tempo que não é só cronológico, mas também sentimental emocio-lógico, baseado em nossas idiossincrasias e relacionamentos com o mundo e as gentes.Vamos pois, poetas, construir nossos opus de luz, mesmo em meio ao pus, ao pó, mesmo em meio às descrenças e desavenças, lançar nossas sementes de beleza que um dia, quem sabe, contaminarão a todos, tal qual uma pandemia, um pandemônio , uma ode à alegria de viver!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

adagio

imagem: water drop - adagio art/flickr

não há lucidez na dor.
nem calma no romper de laços.
há braços que despencam
corpo abaixo
buscando abraços
que já não há mais.
há bocas que mordem o vento
imaginando clausuras.
o leite derramado
não se bebeu:
tragou-o a dureza da terra.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

corpacorpo

imagem: sex bomb/flickr-ilovepie

não te querer assim: sonhadora, romântica, buscando alhures o que aqui não se encontra: o sonho martelava idéias sobre a cabeça e o coração enquanto o corpo apenas se jogava inteiro naquele jaogo de sedução avacalhado: mão na mão olho no olho pele na pele calor e tesão: um avanço, um recuo, outras idas e vindas, lindas as palavras ditas e os sussurros gemidos ao pé do ouvido gargantas secas bocas sedentas mordidas lambidas salivas lânguidas escorrendo pelos cantos sumos o corpo em explosão busca o saciar-se o engendrar-se o fundir-se:

Colado
Calado
Selado
Suado
Su (surrado)
O corpo encontra outro corpo:
Porto inseguro
Augúrio do velho
Do mesmo tema:
Janela vedada
velada
A alma se guarda
Em qualquer redoma:
O corpo não: faz-se
e se refaz
Entre Dioniso e Eros
Erra quem busca
alguma coisa mais?

longe daqui, desta cama macia com lençóis brancos e travesseiros cheirando a erva-cidreita pairam os sonhos: sonhos românticos dos poetas cor-de-rosa que queriam e não queriam estar aqui assim num tempo assim nesta empreitada doce e imaginada: amar a amada,assim, sem mais conversas, jogar-se sobrre o leito e desfrutar a carne, o desejo explodiindo, os corpos em êxtase, tudo tudo e as palavras soltas ditas assim sem mais rodeios muitomais que o te amo muito mais do que te adoro muito mais do que as pérolas de chuva e do que as rosas vermelhas sobre a mesa muiito mais: os sentidos e sua jornada noite adentro gozo gozo gozo corpos embolados enroscados: amor?
Não te querer assim, lírica, leve, mística, rósea: te querer assim: crítica, cítrica, inteira no seu torpor e no seu gozo múltiplo: amor?

Sob o cisne afoita,
leda cisma
enquanto frui
o instante:
será amor
a alquimia dos corpos
ou pura anarquia
do desejo?

terça-feira, 17 de novembro de 2009

doze tulipas

tulips, red - jcolman/flickr

as doze tulipas vermelhas brilhavam no vaso sobre a mesa: ainda estavam frescas, vieram de Amsterdã eu mesmo trouxe na minha bagagem de mão no gelo só pra você sentir a energia e a beleza dessas flores- e eu fico olhando essas tulipas tão vermelhas e tão brilhantes gotas de água ainda pairam sobre suas pétalas e o sol atravessando as folhas dão ainda mais realce a este brilho sim que bonitas estão as tulipas... a energia irradiada não atinge no entanto seu objetivo pois ela eu nós estamos todos muito down- não sei se o efeito estufa se o calor maluco deste verão não sei se o cansaço das coisas o descompasso da vida não sei se os momentos que viemos- nada me diz nada, não sei para que serve tanta beleza essas flores vermelhas doze sobre a mesa doze místicos corações atravessados por setas de dúvidas doze míticos heróis atarantados querendo lutar contra um mal que se vê mas que não se vê um mal de almas e de mentes um mal enraizado um mal estar que não se corrige- esses homens de hoje nós e nosso tempo- um tempo em que se insiste em matar a poesia e calar os poetas e dizem pra quê? Pra quê tanta palavra tonta tenta outras tintas fala do real dos tiros dos atabaques das balas perdidas das minas gostosas se jogando ao vento fala do sexo que é bombombom- não sei pra quê tanta poesia esse tempo nublado não combina pra quê falar de bicho do mato de flor que perfuma de pores de sóis e de luas cheias brancas flutuando sobre nossas cabeças é só a lua é só mais um no céu céu ah que céu estrelado lindo essa via láctea se derramando sobre nós esse sentimento queimando no peito epa! Olha a poesia se infiltrando disparando seus dardos não sei se vou resistir a estas belas doze tulipas vermelhas brilhantes sobre a mesa... sim, sei que elas vão secar, murchar, apodrecer e enfim virar pó- sei, mas é assim: a vida é assim, assim é a poesia- o sentimento do perene e do efêmero. E quando nos dissermos relaxa meu bem é só sexo o que nos une lá no fundo sabemos que não: há qualquer coisa no ar.

há pétalas que antecedem o caos
há petalas que sobrevivem ao caos
há pétalas que fenecem no caos.
o homem não.

sábado, 14 de novembro de 2009

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

poecacto

foto: cactus/flickr/L Lemos

a poesia fere,corta,
machuca,retalha,
dói e estraçalha.
mas guarda em si
a seiva
a água fresca
que mata a sede do poeta
nos desertos estéreis.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

iv


foto: neurone de mer - allaletre(like a foll on the hill)/flickr

pois a luz iridescente da poesia
Me atropela pele e poros:sou
Pura síntese, osmose
De cromakey
Antítese do velho:
Cristais de quebrar
Safiras & esmeraldas
a poesia
Deflagra em mim
Ultrajes e lambidas
Êxtase
Eu te quero, poesia,
Avassaladora em mim
É pra ti que canto
Estes cantos
crus
e insensatos.